Acessórios e Roupas étnicas africanas
(Foto de capa - Criador: PeopleImages | Crédito: iStock by Getty Images)
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Terminamos o texto anterior anunciando que este texto é sobre acessórios e roupas étnicas tradicionais, como referência para a criação de modelos contemporâneos, na produção de coleções de moda afro para os próximos lançamentos no Brasil e no Mundo.
Então mãos à obra!
Vamos conhecer a Capulana, o Aso ìró e os Turbantes e depois o Agbadá, o Budá, o Dashiki Khaftan e o Saruel.
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Para enrolar ao corpo
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Capulana
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As Capulanas são peças de tecidos para serem enroladas ao corpo como roupas, ou à cabeça como turbantes. Por esta condição, as Capulanas podem ser consideradas similares aos sáris indianos, embora a textura de seus tecidos e a figuração cultural de suas estampas sejam tão diferentes.
É o tamanho da Capulana que determina para que tipo de uso ela é adequada. Elas são tecidas de diferentes larguras e comprimentos para serem enroladas no corpo inteiro, só na parte inferior ou só na parte superior do corpo, para serem usadas como turbantes e até para atar os bebês ao corpo da mãe. Enfim, a principal característica das Capulanas é que estas peças de tecidos tradicionalmente não são feitas para serem cortadas e confeccionadas.
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Mãe africana de Guiné Bissau carregando sua criança em uma capulana (Crédito:Tiago_Fernandez/iStock)
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As peças têm acabamento nas beiradas para resistir ao uso e lavagens. E também porque não serão cortadas, as Capulanas podem ter estampas com barrados nos quatro lados ou com imagem no centro predominante, além das listras e estampas tradicionais simétricas, de menores tamanhos e com padronagem repetida em série, parecidas com as padronagens de estamparia contemporânea baseadas em um rapot.
Originalmente as Capulanas são uma tradição de tecelagem de Moçambique, mas hoje são produzidas em quase todos os países da África e são os tecidos africanos mais populares no mundo, incluindo aqui no Brasil.
Tradicionalmente, as capulanas eram tecidas com algodão ou em composições mistas com outras fibras vegetais da flora das regiões produtoras. Atualmente o algodão e estas outras fibras naturais podem ser usados também em composição mista com fibras sintéticas e até mesmo, podemos encontrar capulanas tecidas somente com fibras sintéticas.
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Diferentes maneiras de amarrar a capulana por Sofia Vilarinho (Crédito: canal de Sofia Vilarinho no youtube)
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Para concluir, uma capulana inserida em uma coleção que não seja necessariamente de moda afro, traz consigo o aprendizado de como enrolar e amarrar a peça no nosso corpo, de como criar novas amarrações, de como usar esta peça de tecido para carregar coisas e até mesmo de como usa-la no ambiente. Não seria adorável sair por aí desenhando estampas de capulanas cheias de identidade cultural da miscigenação de povos do nosso país?
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Aso ìró
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O Aso Ìró é um traje yorubá tipicamente feminino.
É um pano retangular, isto é, muito similar à capulana, só que ele é feito para ser enrolado ao corpo como uma saia, amarrado à cintura ou um pouco abaixo do seio.
Seu comprimento é usado em sua maioria bem longo, mas pode ser enrolado com dobras que encurtam o comprimento e com pregas que modificam o seu caimento.
Suas estampas também podem ser localizadas e barradas. Mas diferente das Capulanas, os temas podem ser exclusivamente femininos.
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Trajes africanos típicos femininos com Aso ìró atado à cintura, sobre o budá (Crédito:ivanfolio/iStock)
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O Aso Iró é normalmente usado sobre o budá feminino e pode ser adornado com um iborum, que consiste em uma faixa de tecido jogada sobre apenas um dos ombros, com uma das pontas presa na cintura da frente e outra na cintura das costas.
O Aso Iró, que é claramente a origem das cangas de praia brasileiras, parece ter a sua própria origem no sarongue indonésio.
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Turbantes
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O turbante, que na África também é chamado de Gelê ou Ojá, é uma proteção para a cabeça feita de uma faixa de tecido enrolada, presa com amarrações ou com torções e trespasses prendendo as pontas.
A origem da tradição do uso de turbantes é tão antiga que ainda não pôde ser determinada por historiadores e antropólogos.
Mas por sua função, podemos supor que o uso de turbantes está intimamente ligado à culturas nômades de áreas desérticas, em diferentes lugares da África e Oriente Mèdio, mas também à culturas nômades asiáticas de regiões remotas e clima hostil.
Podemos supor também que culturas nômades espalham comportamentos e hábitos em seus movimentos migratórios sem deixar registros históricos preservados destes eventos.
E que por isso, os turbantes são uma tradição secular em países de cultura e localização tão díspares como a Índia no sudeste asiático e a imensa Rússia de leste a oeste no norte da Àsia, bem como povos africanos e árabes mediterrâneos e povos da África subsaariana, numa área que compreende o continente quase inteiro.
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Lindo e colorido turbante africano (Crédito:PeopleImages/iStock)
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Mas como o assunto aqui é moda afro, é importante entender que, tal como tudo o que é usado para vestir na África, os turbantes representam muitos significados conforme a origem do tecido, sua cor, estampa, volume e formas de atar e prender à cabeça.
O turbante confere distinção social, como por exemplo entre homens e mulheres, entre as posições na hierarquia de poder, etc.
Há também os tipos de turbante que conferem distinção religiosa. Inclusive, segundo religiões de matriz africana, a proteção da cabeça também é muito importante porque é com ela que pensamos, firmamos a nossa fé no divino e o nosso respeito pelo sobrenatural.
Mas uma coisa é certa, todos os tipos de turbante identificam a sua cultura de origem pela tradição de tecelagem da tribo que produziu seus tecidos.
No Brasil a moda afro trouxe de volta o uso dos turbantes não apenas por sua exótica beleza estética, mas principalmente como forma de resgate de todos os conteúdos desta tradição.
Neste contexto, o uso de turbantes incorpora a identidade da cultura africana e honra sua ancestralidade, até mesmo quando as pessoas desconhecem o significado de cada tipo de turbante que elas estão usando.
Por sua beleza e variedade de tipos e modelos, os turbantes exercem o seu facínio nas pessoas pretas e não pretas. Podemos supor que isso acontece porque ele está presente no imaginário coletivo da humanidade.
Os turbantes aparecem até na moda feminina européia de luxo no começo do sec XX, ainda que como influência do "orientalismo".
Mas no Brasil, através de um novo "lugar de fala" da moda afro, os turbantes têm colorido cabeças pretas e não pretas, conferindo a reputação de elegância que esta peça de tradição milenar merece.
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A youtuber Sá Ollebar do canal Preta Pariu ensina diferentes formas de amarrar o turbante. (Crédito: Sá Ollebar/youtube)
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O Brasil hoje usa uma variedade incrível de amarrações e modelos de turbantes, indicando que eles vieram para ficar. E para consagrar de vez o turbante no guarda roupa brasileiro, é só ensinar a história de cada peça da mesma forma que é ensinado como se deve prende-lo à cabeça.
Além da forte empatia das brasileiras e brasileiros com a beleza dos turbantes, nosso clima tropical é muito mais adequado a este tipo de proteção da cabeça, do que aos muitos modelos de chapéu de origem européia que usamos a séculos, apesar de terem pouca ou nenhuma identificação com as nossas necessidades e preferências.
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Para vestir
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Agbadá
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O Agbadá é um traje masculino. Trata-se de uma túnica ampla e solta, com calças bem folgadas, ideais para montar a cavalo. Seu comprimento pode variar da sola dos pés até o joelho.
A palavra iorubana Agbadá significa manto e os povos Iorubá incorporaram este estilo de vestir masculino de tradições muçulmanas, disseminadas pela jihad islâmica em períodos de ocupação dos territórios Iorubá.
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Esquema básico do corte e costura de um Agbadá. (Crédito: Modacad por Telma Barcellos)
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A distinção dos trajes de honra muçulmanos estava na nobreza dos tecidos e na suntuosidade dos bordados de um Agbadá, uma vez que o corte e a confecção das roupas de trabalho e combate eram os mesmos dos Agbadás para ocasiões especiais.
O uso do Agbadá foi consagrado de tal maneira na cultura Iorubá, que é usado até hoje pelos homens em seus territórios e também em outros países africanos. E continua a conferir distinção social pela nobreza de seus tecidos e suntuosidade dos seus ornamentos.
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Jimmy Carter com o Tenente-General Olusegun Obasanjo da Nigéria que usa um exuberante modelo de Agbadá em 1977 (Crédito:Schumacher, Karl H., fotógrafo/ Fonte: Casa Branca/Domínio Público-Wikimedia Commons)
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Há modelos de Agbadá tão valiosos, que são herdados de pai para filho e com o passar das gerações se tornam verdadeiras relíquias históricas.
Vocês não acham que o Agbadá é perfeito para o clima árido do nosso extenso cerrado brasileiro, bem como para nossas ensolaradas regiões litorâneas?
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Bùbá
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O Bùbá é um traje feminino e masculino, também típico das tribos Yorubá.
Como o Agbadá, o Budá é uma túnica de comprimento que varia do joelho aos pés, porém o seu volume não é amplo, de tal forma que, para dar liberdade aos movimentos, ela é aberta na lateral da altura do quadril até à bainha.
Pelo mesmo motivo, para proteger os braços esta túnica tem que ter mangas cortadas à parte e costuradas à cava na túnica. As mangas podem ser curtas ou longas.
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Budá masculino. (Crédito:Prostock-Studio/iStock)
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E também por ser uma peça de roupa mais certa ao corpo, de decote rente ao pescoço, para passar na cabeça ao vestir, o Budá precisa ter um abotoamento frontal de pelo menos três botões, cuja abertura termina antes da altura da cintura.
Conforme a natureza do tecido, o budá pode ser usado desde como roupas íntimas e roupas do dia a dia, até como roupas elegantes para eventos sociais e festivos.
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Dashiki Khaftan
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Dashiki Khaftan é a túnica mais simple de todas. Um tecido com uma abertura no centro para passar a cabeça e duas costuras laterais, com aberturas para passar os braços, é a sua forma mais básica.
Variações simples como usar o tecido em forma de círculo, quadrado, retângulos ou mesmo losângulos causam efeitos visuais originais entre sí.
Já as variações como abertura na frente do decote à bainha, com ou sem trespasse, fazem os modelos se assemelharem a outras peças de roupas, como os quimonos por exemplo. Estes modelos de Khaftan com abertura frontal precisam de acessórios para o fechamento como faixas ou abotoamentos.
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A beleza atemporal de um Khaftan na sua forma mais básica (Crédito:alkir/iStock)
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Na maioria dos países africanos os Khaftans são de uso masculino e feminino. No Marrocos eles são peças de vestuário feminino, usados como longos vestidos.
Na moda em outros países do mundo, encontramos versões de Khaftan em modelos de capas, de blusas, mini vestidos, enfim em peças de roupas de uso mais variado do que o tradicional.
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Saruel
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O Saruel é um tipo de calça cujas principais características são o gancho entre pernas baixo e o volume amplo, que originalmente era atada à cintura com tiras de couro ou faixas de tecidos. O seu comprimento pode variar da altura dos joelhos aos pés.
Estas características conferem ao Saruel uma funcionalidade que se mantém importante do início do seu uso até os dias de hoje - a mobilidade para montar camelos e cavalos, para lutar e trabalhar.
Por esta importante utilidade, o Saruel é uma peça de roupa masculina e feminina.
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Esquema básico de uma calça de gancho baixo, feita para libertar os movimentos - Etiópia. (Crédito: Modacad por Telma Barcellos)
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Por estas qualidades, uso do Saruel é milenar e já se disseminou por todo o mundo. Na moda, sua estética exótica carregada de ancestralidade é muito apreciada e este tipo de calça aparece em coleções de outros perfis de moda além da moda afro.
A palavra Saruel é de origem árabe, mas existem evidências de que a origem da calça saruel seja indiana e de que foi incorporada às tradições árabes desde o sec VI, incluindo aí as tradições das comunidades árabes do norte da Àfrica, que teriam disseminado o uso desta calça para as outras culturas do continente africano.
Hoje existem muitos modelos, com diferentes cortes e volumes para confeccionar uma calça Saruel. A calça Kembe da cultura Yorubá é um bom exemplo de variações do princípio básico da calça Saruel. É uma calça larga da cintura até o joelho, que se afina das panturrilhas até a boca junto aos pés.
Mas uma coisa permanece a mesma para todos os tipos de Saruel. Os tecidos precisam de caimento adequado às peças de volume amplo.
No caso dos tecidos de fibras naturais como o algodão e linho, a gramatura deve ser leve. Nos casos de composição mista de fibras naturais com artificiais, como a viscose, mais importante do que a gramatura é o caimento pesado para o volume não ficar armado.
Já as composições com fibras sintéticas, mesmo com gramatura bem leve podem ter um caimento pouco fluido, que não é adequado para estas peças. As excessões neste caso são mais comuns na categoria das malhas, onde é possível encontrar tramas de fibras sintéticas com caimento fluido ou pesado.
Gostou do nosso texto "Acessórios e roupas étnicas africanas"?
Não perca o próximo e último texto da série!
"Marcas de moda afro e ativistas negros"
Vamos listar as marcas de moda afro que vem se destacando no Brasil e apresentar alguns dos principais ativistas afro que lutam por igualdade racial e social na moda e através dela.
Confira também os primeiros textos da série "Moda Afro - a influencia cultural africana na moda brasileira" , "Tecidos, cores e estampas das roupas africanas" e "Tecidos africanos tradicionais para coleções de moda afro"
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