Moda & Crises #3 a depressão de 1929
Neste texto vamos contrapor dois exemplos de negócios de moda de sucesso enfrentando a crise de 1929, com metas de natureza muito diferentes. Chanel e Sonia Delaunay.
Esta série Moda & Crises que estamos publicando aqui no blogModacad, pretende aprender com crises passadas conhecimentos para enfrentar melhor a crise atual que estamos vivendo.
Depois de falar do impacto social e econômico da mecanização dos processos produtivos do séc XIX na primeira década do séc XX, falamos de negócios de moda enfrentando a I Guerra Mundial e chegou a vez de investigar negócios de moda que sobreviveram à depressão de 1929.
Neste terceiro texto vamos contrapor dois exemplos de negócios de moda que venceram este desafio, porém com metas de natureza muito diferentes.
Uma estilista empreendedora cuja principal habilidade é identificar oportunidades para lançar produtos. E outra estilista cuja principal habilidade é levar a arte para a vida das pessoas de formas originais e inusitadas. Chanel e Sonia Delaunay.
No texto anterior desta série, "Moda e Crises #2, o que podemos aprender com a Primeira Guerra Mundial", falamos de como a criatividade, o desejo e o prazer, que são a essência da moda, encontram novos caminhos para ressurgir após eventos de tamanha privação e devastação, como uma guerra mundial.
Falamos de como o impulso de suprimir a tragédia para reconstruir a continuidade e a evolução encontra forças na mesma fonte do instinto de sobrevivência.
Talvez este impulso explique o fenômeno de que, especialmente nos anos vinte do século passado, a relação entre moda e arte tenha se estreitado ainda mais.
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Primeira página da revista Elite Styles no início da década de 1920. A continuidade do estilo Art Déco que libertou as mulheres do espartilho antes da guerra, na primeira década do sec XX. (Crédito: Public Domain Pictures
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Somaram-se ao estilo Art Déco, que tantas inovações realizou na moda na primeira década do sec XX, novos movimentos artísticos como o Dadaismo e o Surrealismo.
Um destaque destes novos estilos estéticos é que suas obras se lançaram para além das artes plásticas tradicionais, colorindo e pintando ambientes, mobiliários, veículos e, claro, roupas, acessórios e têxteis em geral.
Em sintonia com esta originalidade tão inédita, os conceitos de elegância feminina finalmente passam a consagrar a postura vanguardista em oposição ao comportamento aristocrático tradicional, ainda que esta conquista só tenha sido possível depois de vencer muita resistência.
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O avanço das mudanças no guarda roupa feminino nos anos loucos da década de 20 do século passado. (Crédito:Casarsa/iStock)
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Enfim, o que era vanguarda antes da guerra, se populariza num claro movimento de consagração de importantes mudanças de comportamento.
Neste novo contexto, o conceito de elegância feminina consagra agora a mulher de cabelos curtos e penteados despojados, de vestidos com silhuetas de corte solto em linhas retas, mostrando cada vez mais as pernas e a mulher vestindo roupas esportivas e trajes de banho que mostravam o corpo como nunca antes.
Resumindo, o conceito de elegância feminina finalmente passa a consagrar a mulher contemporânea como padrão social de referência.
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Final da década de 1920, Lucette Desmoulins atriz de teatro francesa. Fotógrafo desconhecido. (Publicado por: Star (Etoile) Photographer Unknown. Public domain, via Wikimedia Commons)
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Em meio a todas estas conquistas, um evento histórico merece destaque especial. Esta nova "elegância feminina" passa a ser desenhada cada vez mais por mulheres vanguardistas. Chanel e Sônia Delaunay são grandes protagonistas desta importante mudança!
Um viva para a moda desenhada por mulheres contemporâneas, para mulheres contemporâneas! Podemos supor que este foi um fator fundamental para conter as constantes tentativas de retrocesso social das conquistas femininas ao longo do século XX.
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Chanel
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Já falamos no texto anterior de como antes da Primeira Guerra Mundial, Chanel era primeiro uma autora da revolução do comportamento feminino com suas próprias atitudes e estilo de vida, para só depois se realizar como uma das grandes estilistas da revolução no guarda roupa feminino, que consagrou a imagem de vanguarda desta "mulher contemporânea" do século XX.
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Coco Chanel 1929. (Kristine/Flickr)
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Depois da Guerra, Chanel faz mais do que continuar a produzir coleções com um estilo cada vez mais original. De 1920 a 1928, sua atitude empreendedora identifica novas oportunidades em pleno caos do ritmo quase alucinante das mudanças de comportamento no mundo.
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O icônico perfume Chanel N5. (Crédito:Christopher Ames/iStock)
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Em 1921 ela lança o perfume Chanel nº5, "um perfume atual, para sempre". Este foi um slogan profético! O perfume feito para "uma mulher em movimento" é consagrado no mundo inteiro até hoje, completando neste ano de 2021 um século de sucesso de mercado. Em 1922 o perfume Chanel nº22 chega ao mercado.
Em 1924 a maison Chanel lança sua primeira linha de maquiagem, justo no momento em que a maquiagem se consagrava como símbolo de rebeldia feminina, desconstruindo mais um tabu que limitava a sensualidade.
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Cipria Chanel, a primeira linha de maquiagem CHANEL Cosmetic Products, 1924. (Crédito: Site Chanel Oficial)
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Em 1925 o lançamento do perfume Gardênia e em 1927 do perfume Cuir de Russie são a consagração do sucesso da linha de perfumes.
Mas, o DNA empreendedor da criatividade de Chanel já havia concretizado mais uma façanha. Também em 1927 ela lança a sua primeira linha de produtos para "cuidar da pele e da beleza".
Em 1928, a maison Chanel ainda lança o perfume "Bois des Îles" antes da Crise de 1929.
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Sonia Delaunay
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Falar da trajetória de Sonia Delaunay é também conhecer uma face diferente do que consideramos como sucesso do talento para empreender.
A ousadia e a originalidade de Sonia se revelam muito mais no seu talento e performance artística, do que no seu também reconhecido sucesso de mercado.
Sonia era uma artista com profundo conhecimento técnico e histórico das artes plásticas. Órfã de pai e mãe ainda na primeira infância, ao contrário de Chanel, Sonia foi criada por um casal de tios que proporcionou a ela um lar afetuoso, educação esmerada e viagens pelos melhores museus da Europa desde a sua tenra infância.
Nascida na Ucrânia, Sonia Delaunay viveu com os tios em são Petersburgo e estudou artes na Alemanha antes de iniciar sua carreira artística em Paris.
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Sonia Delaunay vestindo suas criações para a Casa Sonia em Madrid, c.1918-20. (AnônimoUnknown author, possivelmente por Zockoll, Public domain, via Wikimedia Commons)
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Nos dias de hoje, a personalidade artística de Sonia seria definida como multimídia. Além da pintura nas telas, Sonia já fazia arte sobre outros suportes na sua vida pessoal, como por exemplo objetos e tecidos, encadernações e roupas exóticas para ela e seu marido Robert Delaunay, bem como para alguns poucos amigos do seu amplo círculo de amigos entre artistas e escritores. Ela também ilustrou poesias e a decoração autoral de sua casa era de uma originalidade impressionante.
Antes de começar a pintar sobre tecidos na década de 1920 e de iniciar a sua trajetória na criação de mais de duas mil estampas para indústrias têxteis consagradas, bem como de criação de coleções de roupas, acessórios e objetos de decoração, em 1911 Sonia costura uma colcha para o enxoval do seu filho, criando um patchwork que é considerado pelos críticos de arte como o marco inicial do seu arrojado trabalho artístico, com os inéditos conceitos de abstração geométrica com blocos de cores, que revolucionaram os conceitos acadêmicos de cores, luz e formas da época.
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Manta feita por Sonia Delaunay para o nascimento de seu filho. (Crédito:Sonia Delaunay, Manta, 1911, tecido, 109 x 81 cm (MNAM, Centro Pompidou))
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Como artistas, Sonia e seu marido Robert Delaunay eram tão originais que não podiam ser qualificados sequer nos estilos artísticos recém estipulados como o cubismo, por volta de 1907, por exemplo.
Por esta condição são considerados pioneiros em um estilo peculiar, denominado Orfismo por Guillaume Apollinaire, cuja principal originalidade reside no contraste entre os blocos de cor, que o casal Delaunay batizou de "simultaine".
Este nome representava a ideia de simultaneidade entre a nossa percepção e o nosso pensamento experienciando uma obra de arte de forma individual.
Se cada ser humano tem uma história única, que proporciona uma experiência pessoal da obra de arte também única, para mim, há nesta ideia de simultaneidade uma libertação do olhar crítico e acadêmico. E isso nos leva a supor também que a criatividade precisa quebrar padrões para se realizar com plenitude.
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Marché au Minho (1916) - Sonia Delaunay (Crédito:Pedro Ribeiro Simões/Centro de Arte Moderna (CAM), Calouste Gulbenkian Foundation, Lisboa, Portugal)
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Mais. Para mim o nome "simultaine" se revelou profético na vida de Sonia, abarcando muito mais do que o seu profundo conhecimento das cores e a sua originalidade na pintura nas artes plásticas. "Simultaine" também pode definir a desenvoltura de Sonia como pioneira na realização de tantos talentos ao mesmo tempo. Robert nunca ousou compartilhar sua carreira de pintor com outras "formas" de arte.
Mesmo nas artes plásticas, Sonia já concilia a pintura sobre telas com a pintura sobre suportes inusitados como colagens, cortinas e paredes, em uma trajetória que evolui para experiências com cenografia e figurinos, até chegar na moda e no design de objetos para decoração de interior.
Uma obra que expõe esta originalidade que lança a pintura a espaços inéditos é "La Prose du Transsibérian et de la Petite Jehanne de France", um longo poema de Cendrars. Esta obra é um "livro" dobradura de uma faixa de papel de dois metros, com o texto impresso, misturado às cores e formas pintadas por Sonia Delaunay ao longo de toda a sua extensão.
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La Prose du Transsibérien et de la petite Jehanne de France. Livro ilustrado com aquarela aplicada através de pochoir e impressão em relevo sobre papel, 200 x 35,6 cm. Sonia Delaunay, Blaise Cendrars, 1913. (Princeton University Art Museum.jpg -Criado: 1 de janeiro de 1913)
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Este é apenas o primeiro de seus "poemas visuais". Estes poemas visuais assumem também novas formas como os "vestidos poemas". Modelos estampados com versos de seus amigos poetas eram obras para vestir, ler e serem lidas "simultaneamente".
Para se ter uma ideia de como esta trajetória profissional na moda e no design de objetos para decoração de interior abalou céus e terras naquele contexto social e histórico na primeira década pós-guerra, Sonia foi duramente criticada no próprio meio artístico por comercializar seu talento em outras artes.
Ela foi também penalizada pela crítica por décadas a fio com o vazio argumento de que a sua dedicação compartilhada à várias formas de arte retardava o seu amadurecimento estético na pintura.
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Auto-retrato, estudo para a capa do catálogo da exposição de Estocolmo (1916) - Sonia Delaunay (Pedro Ribeiro Simões de Lisboa, Portugal, CC BY 2.0 https://creativecommons.org/licenses/by/2.0, via Wikimedia Commons)
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Eu particularmente julgo ser a realidade o oposto disso. Quanto maior a diversidade de desafios a um artista, maior é a amplitude de sua experiência e a sofisticação do seu olhar para o mundo.
O empreendedorismo de Sonia Delaunay no mercado da moda e das artes decorativas foi precipitado pela perda da renda dos seus bens na Rússia, confiscados pela revolução em 1917, penúltimo ano da Primeira Guerra mundial.
Esta trajetória tem início no desenho de figurinos para o mundo de espetáculos, onde ela vem a conhecer Sergei Diaghilev, empresário dos "Ballets Russes", também refugiado na Espanha.
Com Sergei, Sonia desenha os figurinos para os históricos Ballets Cleópatra e Aída por volta de 1918 e tem início a consagração do seu nome artístico nestes espaços de criação sem a participação de Roberto Delaunay, seu parceiro nas artes plásticas.
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Atriz Lubov Tchernicheva no balé Cléopâtre com figurino criado por Sonia Delaunay para Sergei Diaghilev. (Crédito: S. Georges, sem data. Lubov Tchernicheva Papers. b MS Thr 464 (14), pasta 1. Adquirido com o Howard D. Rothschild Fund, 1995./ Figurino de Sonia Delaunay - Wikiart/ )
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Neste momento de evidência aos olhos do público, Sonia Delaunay abre em Madri sua primeira boutique, a "Casa Sonia". Mas suas criações eram tão inovadoras, que o sucesso não chegou com tanta força ao grande público, cativando seus clientes fiéis em sua maioria entre os intelectuais e a burguesia de vanguarda.
Isso acontece porque Sonia não faz distinção entre a criação para as artes plásticas e a criação para o que chamamos hoje de desenho industrial. Suas roupas, bijuterias, acessórios e objetos de decoração, tal como suas pinturas, eram criações cuja originalidade provocava mudanças de mentalidade.
Suas criações jamais eram concebidas para estar em harmonia com a mentalidade predominante, como a moda busca fazer nos dias de hoje, identificando primeiro as tendências presentes no desejo da maioria das pessoas num determinado momento, para só depois desenhar as coleções.
De volta a Paris em 1921, Sonia abre a Boutique "Simultáne".
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Vitrine da "Boutique Simultânea & Heim Furs" de Sonia Delaunay, na Pont Alexandre III Paris, em 1925. (Crédito: Placa fotográfica N ° 18 de "Facades et agencements de boutiques". Editor Charles Moreau, Paris, 1925. Formato sem moldura: 28 x 24 cm. - para Moderno / s.)
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A Simultánea vai além da Casa Sonia, por incluir também uma galeria de arte. Mas se tornou mais. Muito mais! Se tornou um espaço de produção de arte e cultura ao vivo, conforme descreve o poeta surrealista Réné Crevel.
Desde a entrada foi uma surpresa. As paredes estavam cobertas com poemas multicolores. Georges Auric, com um pote de tinta numa mão, pintando com a outra uma esplêndida chave de sol, em meio a outras notas. Ao seu lado, Pierre de Massot traçava uma frase. O dono da casa convidava todos os recém-chegados ao trabalho.
CREVEL, 1925, 18.
Em 1925, durante a Exposição de Artes decorativas de Paris, Sonia Delaunay abre uma boutique com o estilista francês Jacques Heim, consagrado por suas coleções de roupas e acessórios de peles de animais para a moda feminina de luxo.
Neste ano Sonia estampou tecidos com sua arte em parceria com a Liberty de Londres e a Metz & Co. de Amsterdam. Suas roupas chegam a ser vendidas em lojas de departamento em Nova York.
Os "vestidos simultâneos" de Sonia Delaunay pareciam feitos para mostrar os movimentos do corpo feminino dançando foxtrot ou tango no "Le Bal Bullier".
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Vestido de Sonia Delaunay (Crédito: Domínio Público/WikiCommons)
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Seu estilo é facilmente identificável por seus blocos de cor estampados ou revelados em verdadeiros patch works compostos pelas partes dos modelos. Mas Sonia deixava bem claro que suas roupas eram criadas para vestir mulheres e não para servir de suporte à sua arte.
Esta declaração é praticamente um certificado da sua reconhecida competência no desenho industrial.
Para mim, a linha mestra que divide o desenho industrial das artes plásticas é o compromisso com a funcionalidade.
O desenho industrial é concebido na sua gênese para cumprir um propósito funcional e deve fazê-lo com competência. A sua arte está em cumprir sua função com qualidade, beleza e originalidade.
Ainda na década de 1920, em 1923 Sonia Delaunay desenhou os figurinos da peça "Le Coeur á Gas" de Tristan Tzara, poeta considerado um dos fundadores do Dadaismo, e em 1926 desenhou o figurino do filme "Le P’tit Parigot", dirigido por René Le Somptier.
Seus desenhos de figurinos continuam a influenciar estilistas desde a década de vinte até hoje, quatro décadas após a sua morte.
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A Crise de 1929
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Mas o que acontece com estes negócios de sucesso quando estoura a "grande depressão de 1929"?
A Crise de 1929, também conhecida como a Crise da Superprodução, foi uma forte recessão da economia americana, com efeitos no mundo inteiro. Seu período mais crítico foi de 1929 a 1933, mas mesmo após este período, seus efeitos perdem força lentamente.
Entre muitas outras consequências seríssimas para a nação americana, a Crise de 1929 fechou quase um terço das indústrias, desempregando também quase um terço da mão de obra trabalhadora da maior economia do mundo, responsável por quase 40% da produção e do consumo do mercado nacional e internacional.
Resumidamente, o mecanismo que quebrou o mercado financeiro americano foi a euforia do rápido crescimento econômico dos Estados Unidos. A escalada de produtividade nunca antes vista nas indústrias foi alcançada sem dimensionar o crescimento do poder aquisitivo da população de consumidores. O resultado foi um aumento exponencial da oferta com uma queda profunda da procura.
Em outras palavras, o mercado consumidor perdeu seu poder de compra e parou de consumir. Esse é o ponto crucial para a nossa reflexão. Como sobreviver à falência se o fenômeno era mundial? Como empreender novos negócios e novos produtos para demandas não atendidas se o mercado consumidor não tinha recursos para consumir?
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Chanel nos anos 30
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Um fator externo à moda cria a oportunidade para Chanel se manter no mercado. Mais. Para ampliar a exposição da moda francesa, consagrando de vez a tradição da alta costura de Paris como fonte de tendência para negócios de moda de todos os portes e perfis no mundo inteiro.
A indústria cinematográfica americana, completando apenas três décadas de idade na crise de 29 e só 2 anos do cinema falado, ainda tinha muitas possibilidades inexploradas para buscar sua sobrevivência na crise.
Como resposta a este desafio, os produtores de cinema decidiram investir na consolidação do público feminino, cujo interesse pelo cinema já era evidente. As estimativas eram de que o sucesso desta iniciativa poderia quase dobrar o público de cinema.
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Coco Chanel. (Crédito: Justine Picardie, CC BY-SA 4.0 https://creativecommons.org/licenses/by-sa/4.0, via Wikimedia Commons)
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O primeiro passo para conquistar as mulheres era identificar o que mobiliza a atenção e o prazer feminino. Com certeza a moda está entre os interesses femininos prediletos.
A pedido do produtor norte-americano Samuel Goldwyn, Gabrielle Chanel partiu em fevereiro de 1931 rumo a Hollywood, para vestir as atrizes do estúdio United Artists. Criou assim o guarda-roupa para os seguintes filmes: Tonight or Never (1931) e The Greeks Had a Word for Them (1932).
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Filme Tonight or never com figurino assinado por Chanel. (Time Inc .; fotografia por Columbia Pictures (nenhum fotógrafo creditado), Public domain, via Wikimedia Commons)
Samuel Goldwin queria mais do que vestir suas personagens com um estilo sofisticado. Ele queria que as mulheres fossem continuamente atraídas ao cinema para ver as últimas novidades da moda francesa vestidas por suas estrelas.
Chanel assina um contrato de um milhão de dólares para fazer este trabalho.
Mas Chanel não pára por aí. Nos piores anos da crise ela investe em mais uma façanha.
No seu palacete no n.º 29, rue du Faubourg-Saint-Honoré em Paris, Gabrielle Chanel apresentou BIJOUX DE DIAMANTS, a sua única coleção de Alta Joalharia. Foram propostas mais de 45 peças.
A estilista que havia desbancado as joias, criando bijuterias e consagrando a sua reputação de bom gosto na moda, agora faz o caminho inverso lançando uma coleção de joias de diamantes.
Não é difícil supor que em momentos de crise, a seleta população muito rica é a única com poder aquisitivo disponível no mundo. E supor também que por esta faixa de consumidores não ser muito numerosa, a oferta de criações de maior valor unitário compensa a venda em quantidades menores.
Fazendo um paralelo com a nossa crise atual, depois da eclosão da pandemia, em menos de 2 anos o mercado de luxo teve um crescimento exponencial e a marca Luis Vuilton gerou a principal receita para que o grupo LVMH, que também é dono da Dior, alcançasse o lugar de uma das maiores empresas do mundo.
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Sonia Delaunay
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A eclosão da crise de 1929 obriga Sonia Delaunay a fechar o Atelier Simultané e sua grife de moda parisiense, a Maison Delaunay.
Em 1930 Sonia volta a pintar, mas a parceria com a Metz & Company iniciada nos anos de 1920 continuou até meados da década de 1960. A tecelagem holandesa estima que Sonia Delaunay criou mais de duas mil estampas para seus lenços e tecidos.
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Tafetá de seda com design geométrico de Sonia Delaunay. França, agosto de 1924. (Lyon, Musée des Tissus MTMAD. Doação de Delaunay em 1965. MT 33718I, CC BY-SA 4.0 , via Wikimedia Commons)
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A partir de 1930, ela passa a trabalhar mais de perto com Joseph de Leeuw, o chefe de visão da Metz & Co. Sonia desenhou também móveis para a Gerrit Rietveld e tecidos e tapetes para a Bart van der Leck a pedido de Joseph.
A trajetória profissional desta artista excepcional que sobreviveu à revolução russa, à crise de 1929 e às duas Guerras Mundiais, se estende até o ano de sua morte em 1979.
A partir de 1976 ela inicia a criação de uma coleção têxtil e o design de talheres e joias para a empresa francesa Artcurial, com inspiração nos seus trabalhos na década de 1920.
Sua autobiografia "Nous irons jusqu'au soleil", iremos até o sol, foi publicada em 1978.
Mas dentro do seu amplo espectro de obras, para mim, duas das mais surpreendentes foram a estampa criada para o carro Matra 530 em abril de 1967 e "Robes Poemes", poemas vestidos, publicados em 1969 com textos de Jacques Damase, com quem três anos antes, ela já havia publicado "Rythmes-Couleurs", rítimos das cores.
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No ano de 1967 o carro Matra M530A pintado por Sonia Delaunay (Ton1~commonswiki, CC BY-SA 3.0, via Wikimedia Commons)
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Em 1964, Sonia e seu filho Charles Delaunay doaram ao "Musée National d'Art Moderne" de Paris 114 obras de Sonia e Robert.
Sonia Delaunay viu em vida suas obras expostas no Louvre em 1964. Antes dela, apenas o pintor Braque também havia conseguido esta façanha, em 1961. Além desta honra, ela recebeu a nomeação da Legião de Honra Francesa em 1975.
Ela faleceu em 5 de dezembro de 1979, em Paris, aos 94 anos, deixando para trás uma marca na história da nossa civilização, ao invés de um império lucrativo após a morte de sua criadora, como é o caso de Chanel.
Dois feitos notáveis, porém, de naturezas tão distintas que não cabe comparações.
Minha admiração pela criatividade e tenacidade destas duas grandes mulheres é da mesma medida da gratidão que tenho por tudo o que podemos aprender com elas.
Gostou deste texto "Moda & Crises #3 a depressão de 1929"?
Confira também os primeiros textos da série "Moda e Crises #1 - o que podemos aprender com o passado" e "Moda e Crises #2 - o que podemos aprender com a Primeira Guerra Mundial".
Ah! No final deste texto "Moda e Crises #2 - o que podemos aprender com a Primeira Guerra Mundial" prometi investigar os rumos da fusão de Georges Doeuillet com a maison Jacques Doucet, em 1929, em pleno crash da bolsa.
Infelizmente, sob a direção de Georges Auber, Doucet-Doeuillet fechou pouco depois, ainda no ano de 1930.
Não perca os próximos textos desta série Moda & Crises. Suspeito que ainda há muita coisa a ser dita antes de chegarmos à pesquisa sobre a moda e a Segunda Guerra Mundial.
O que mais podemos aprender para lidar com a crise que estamos enfrentando com esta pandemia?
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