O retorno dos corantes naturais
(Foto de capa- Crédito:Pere_Rubi)
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Hoje vamos falar sobre os corantes naturais. Como já falamos no post "As Técnicas de Tingimento Industrial e sua História", as primeiras técnicas de tingimento têxtil extraíam seus corantes de matérias primas encontradas na natureza. São os corantes têxteis naturais.
Mas afinal, o que são os corantes têxteis? São compostos orgânicos que dão cor às fibras. Os corantes impregnam as fibras colorindo os fios e reagem às substâncias usadas nos processos de beneficiamento e tingimento dos tecidos. O tipo de processo de tingimento e a categoria do corante indicada para cada tecido varia de acordo com a fibra.
A milhares de anos os seres humanos usam estes corantes extraídos de plantas, de minerais e de alguns tipos de animais para fazer o tingimento de seus tecidos. No entanto com a criação e industrialização dos corantes químicos e sintéticos, os corantes naturais caíram em desuso e foram substituídos tanto nos processos de tingimentos industriais, como nos processos artesanais.
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(Crédito:Sirirak/istock)
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A substituição do uso dos corantes naturais, entre muitos outros fatores de custo e dificuldade de produção, é também explicada pelo fato dessas substâncias possuírem menor estabilidade do que os corantes sintéticos modernos.
A estabilidade de um corante têxtil é a medida da qualidade e durabilidade da cor que ele consegue fixar na fibra que compõe o fio, que tece o tecido colorido. Entre os principais fatores que alteram a estabilidade dos corantes estão a temperatura, o oxigênio e a luz presentes na vida útil dos tecidos.
O que atenua a ação destes fatores sobre a estabilidade dos corantes naturais são a presença em sua constituição dos agentes quelantes, que garantem a solubilidade em água, e dos óxidos que possuem resistência extremamente forte à luz.
Para proteger e potencializar a estabilidade dos corantes são usados os mordentes. Os mordentes usados com os corantes naturais também são preferencialmente naturais, de extração mineral, como o sal marinho por exemplo, ou vegetal como por exemplo o vinagre.
A maioria dos corantes sintéticos é classificada como seguro, no entanto, parte dos corantes químicos e sintéticos são densos e tóxicos, alguns deles têm em sua composição substâncias como nitrogênio, nitroglicerina, ou TNT que são explosivos e poluentes.
Por isso a preocupação com o meio ambiente na cadeia produtiva têxtil, com seus movimentos como a moda slow por exemplo, já está resgatando o uso dos corantes naturais e também as técnicas de tingimento têxtil artesanal.
Atualmente, as cores obtidas com estes processos de tingimento ainda são em sua maioria de natureza vegetal ou animal.
Falando das fontes de corantes de natureza vegetal, é possível tingir roupas usando algas marinhas e flores, folhas, frutos, raízes e caules de plantas diversas.
Falando das fontes de corantes de natureza animal, os corantes naturais podem ser encontrados em alguns insetos, entre os quais as cochonilhas, que possuem matéria cromática inteiramente concentrada e o molusco marinho dos gêneros murex brandaris que serve como matéria prima para o corante natural púrpura.
Para tingir os tecidos é necessário triturar a matéria prima, ferver até a água ficar colorida e pronto! Basicamente, este líquido colorido, depois de coado, já pode ser usado como corante.
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As matérias primas dos corantes naturais trituradas (Crédito:Marat Musabirov/iStock)
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Porém é necessário utilizar alguns sais orgânicos como mordentes para que o efeito das cores no tecido seja duradouro, fazendo com que elas não desbotem com os processos de lavagem, de exposição ao sol e de desgaste da vida útil dos tecidos.
Os sais mordentes naturais podem ser de origem vegetal e mineral. Os de uso mais comum são o acetato de ferro caseiro, o acetato de cobre caseiro, o alúmen de potássio (pedra úmen), o sal marinho e o vinagre para fixar as cores.
Mercado e meio ambiente
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Os consumidores estão cada vez mais interessados em produtos de origem natural, que causem menores danos à saúde humana e ao meio ambiente. Dessa forma, para atender às demandas desse novo mercado, as indústrias alimentícia, cosmética, papeleira e têxtil têm buscado usar mais corantes naturais em seus produtos.
Os corantes naturais, quando comparados aos corantes sintéticos, apresentam uma grande vantagem no tratamento de efluentes, (resíduos provenientes das indústrias, dos esgotos e das redes pluviais, que são lançados no meio ambiente, na forma de líquidos ou de gases), que representa um grande problema na indústria têxtil.
Tradicionalmente, a etapa industrial de tingimento é uma das que mais utiliza a água em seu processo produtivo, o que gera uma grande quantidade de efluentes, cujo destino são os rios. Cerca de 90% do consumo de água de toda indústria têxtil se dá no processo de tinturaria.
Sendo assim, um grande volume de efluentes dos processos de tingimento é despejado nos rios todos os anos, no mundo inteiro, causando grandes danos ao meio ambiente. Uma área promissora para o tratamento desses efluentes tem sido a pesquisa e a implementação dos métodos de biodegradação. No entanto, os corantes sintéticos não são biodegradáveis pelos microorganismos, aumentando ainda mais o interesse sobre os corantes naturais, por sua qualidade biodegradável.
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Processos naturais de tingimento tem resíduos biodegradáveis (Crédito:Mabelin Santos/iStock)
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Sobre o potencial de mercado dos corantes naturais, estima-se que para suprir o consumo anual de fibras coloridas necessita-se de 100 milhões de toneladas/ano de corantes. Um desafio para a precisão desta estimativa é o fato de que os rendimentos destes corantes naturais em relação ao peso seco de matéria-prima são muito variados. Para se avaliar esta variação, as conchas de Murex, que produzem o corante púrpura, tem um rendimento de 0,01%, enquanto os corantes extraídos a partir de madeira tem um rendimento de 10% em média.
Por estas e outras razões, até agora, apenas um número muito reduzido de corantes naturais tem-se revelado comercialmente viável. Assim, o uso destes corantes é majoritário na coloração de gêneros alimentícios e cosméticos. Mesmo assim, apenas corantes selecionados são aceitos no mercado, devido às rigorosas normas de segurança em relação a dados toxicológicos e farmacológicos.
A Industria Têxtil brasileira dentro deste contexto
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Atualmente no Brasil, a indústria têxtil é uma das mais afetadas pela concorrência com os produtos da China.
Para fazer frente a esta concorrência, um dos caminhos é agregar novos valores aos produtos têxteis. Os corantes naturais podem cumprir este papel pela variedade e originalidade de seus resultados de coloração e por atenderem à demanda crescente do mercado por produtos que preservem os recusos naturais e o meio ambiente.
Esta busca de diferencial para os produtos tem impulsionado as pesquisas científicas e o desenvolvimento da indústria têxtil brasileira que tem investido na adoção de novas tecnologias.
O futuro do uso industrial dos pigmentos de corantes naturais na indústria têxtil brasileira depende diretamente do desenvolvimento e adoção destas novas tecnologias.
O desenvolvimento de tecnologias brasileiras nesta área pode garantir o pioneirismo produtivo que consolida o domínio de mercado pelo importante período de consagração de um produto.
Embora haja uma grande quantidade de pigmentos provenientes de fontes minerais e animais, as plantas são fontes abundantes de obtenção de corantes, porque os pigmentos podem ser extraídos das flores, frutos, folhas, ramos, cascas, troncos e raízes. Mas a extração e o cultivo destas plantas também precisam ser operacionalizados de forma sustentável.
Uma fonte importante de corantes vegetais é a madeira. Primeiro porque os corantes são fácilmente extraídos da madeira e estes corantes extraídos da madeira são facilmente solúveis em água, ou em solventes orgânicos neutros, como o etanol.
Segundo porque a extração destes corantes pode ser feita usando resíduos de madeira de outros os processos mecanizados desta matéria prima, muito volumosos na indústria brasileira. Como estes resíduos não tem o descarte regulamentado, causam importantes problemas ambientais. Estima-se que o consumo de madeira nativa em toras seja de 34.000 m³. Considerando que, em média, o aproveitamento é de apenas 50 % deste volume no desdobre da madeira, conclui-se que aproximadamente 17.000 m³ é o volume de resíduos florestais no Brasil
Sabemos que a transformação de resíduos em matéria prima preserva o meio ambiente duplamente.
Primeiro poupando o meio ambiente dos danos com o descarte.
Segundo poupando o meio ambiente do consumo dos recursos naturais para produzir aquele volume de matéria prima pelo cultivo ou extrativismo.
O estudo de algumas madeiras, notadamente amazônicas, verificou que os extratos destes resíduos tem grande potencial como fonte de corantes naturais com boas qualidades de resitência à luz e de fixação nas fibras, para tingimento em algodão e papel.
Estamos diante de uma tendência?
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Resumindo, de um lado temos o crescimento do mercado consumidor que valoriza produtos feitos com matérias primas naturais, com processos produtivos sustentáveis, ou que preservem cada vez mais o meio ambiente, incentivando o aumento do uso de corantes naturais.
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( Crédito:Tanes Ngamsom/iStock)
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De outro lado, o potencial do Brasil de ser um forte fornecedor destas matérias-primas corantes por causa da nossa riqueza em biodiversidade e das nossas abundantes fontes de resíduos de madeira, cujo potencial como matéria prima para extração de corantes é muito rico.
Tendência e realidade
Para avaliar de forma realista a possibilidade de usar corantes naturais em larga escala, precisamos de pesquisas e levantamentos para avaliar o potencial de fornecimento desta matéria-prima. É preciso avaliar os custos e a sazonalidade da produtividade, comparados ao volume da demanda no mercado mundial e a logística para operacionalizar todos os negócios desta cadeia produtiva.
Do ponto de vista da qualidade, o desenvolvimento destes produtos para uso industrial precisa garantir a estabilidade do corante, sua fixação, as caracteriísticas químicas, estudos toxicológicos e farmacológicos. Sendo todos estes parâmetros objetos obrigatórios de pesquisa e solução para o desenvolvimento das tecnologias.
As inovações tecnologicas podem fazer com que o corante natural não seja só uma moda passageira (Fonte: young.jekar - pixabay)
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Apesar de serem biodegradáveis, atóxicos e não prejudiciais ao meio ambiente, os corantes naturais acabam exigindo a utilização de substâncias potencialmente tóxicas para que possam ter suas cores adequadamente fixadas nas fibras têxteis.
Pensando nisso, pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) desenvolveram uma nova forma de aprimorar a fixação de corantes naturais aos tecidos. Esse processo, chamado de sol-gel, envolve a proteção de moléculas de quatro tipos de corantes naturais em cápsulas nanométricas de sílica.
Em seguida, por meio de uma averiguação da capacidade de tingimentos e qualidade das cores obtidas, verificou-se que os corantes encapsulados demonstraram melhor desempenho em comparação aos não-encapsulados, tanto no processo de tingimentos como no de lavagem.
A partir de análises por microscopia eletrônica de varredura, os pesquisadores verificaram também que a utilização dos corantes encapsulados não provocou danos às fibras. Eles analisaram também a estrutura nanométrica das partículas de corantes encapsuladas, o que indicou diferenças nas estruturas nessa escala, explicando assim a relação dos diferentes tipos de corantes e suas interações específicas com as fibras têxteis.
A partir desses resultados, considera-se a possibilidade de desenvolvimento de novos processos industriais para o tingimentos de tecidos sem que seja necessário o uso de sais de metais pesados para a fixação de corantes.
Métodos de tingimento que poupem recursos naturais valiosos como a água e que sejam menos poluentes para o meio ambiente podem alcançar um lucrativo valor de mercado, também porque devem ter custos menores do que os processos de tingimento em uso industrial atualmente.
Considerando todos estes fatores, podemos concluir duas coisas. Primeiro que o investimento em pesquisas nas universidades públicas e no desenvolvimento de tecnologias aplicáveis ao mercado, nos âmbitos público e privado, precisam ser garantidos e incentivados, já que o retorno pode ser tão promissor.
Segundo, que a sustentabilidade pode ser uma grande parceira da eficiência que trabalha para a lucratividade! E viva a sustentabilidade!!!
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