Tipos de couro - o processo produtivo, polêmicas e curiosidades
(Foto de capa - Criador: eclipse_images | Crédito: Getty Images)
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O couro está na lista de ítens polêmicos da moda atualmente. Em tempos de moda vegana e sustentável, o uso do couro pelas marcas tem sido bastante questionado.
A beleza, a durabilidade e a qualidade das roupas de couro são fatores que fazem com que muitas pessoas ainda comprem essas roupas, apesar do valor do investimento ser alto e da consciência de que o couro anda na contramão da sustentabilidade e do cuidado com o meio ambiente.
Neste texto vamos falar sobre a origem do uso do couro e de como é o seu uso na moda atualmente.
Vamos dividir aqui em 3 tipos os "couros" que são mais conhecidos no mercado: o couro legítimo, o couro sintético e o couro ecológico. Mesmo com aparência semelhante, cada um tem um tipo de composição e é produzido de uma forma diferente.
Apesar de todos eles serem chamados de couro, existe uma lei de 1965 que proíbe que o "couro" que não seja de origem animal seja denominado como couro. Porém, na prática esta lei não é respeitada. Eu mesma já comprei inverno uma calça e jaqueta de "couro sintético”. Você pode conferir aqui os termos da lei nº4.888.
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Couro natural ou legítimo
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O couro natural ou legítimo é a pele animal que passa pelo curtimento, um tratamento químico, para preservar a pele e impedir a putrefação. Podem ser curtidas as peles de bovinos, inclusive bezerros, ovelhas, cabras, lhamas, vicunhas, camelos, porcos, cobras, cavalos, búfalos, cangurus, crocodilos, peixes, rãs, aves, como o avestruz, e outros animais. O couro natural é usado em roupas, calçados, móveis, entre outros produtos.
Este couro tem qualidades que os "couros" sintéticos ainda não oferecem. Ele é permeável permitindo que a nossa pele transpire, o que proporciona conforto durante o uso. É elástico e flexível, mas resistente à tração ou estiramento. É por isso que um sapato de couro pode se adaptar ao pé durante o uso e depois voltar à sua forma original quando estiver em repouso. O couro legítimo é também resistente à abrasão, isto é, resistente a atritos.
Os produtos químicos usados no processo de produção do couro podem ser bastante prejudiciais à natureza. Os resíduos provenientes desse processo necessitam de cuidados especiais para o descarte adequado. Porém, muitos curtumes ignoram esses cuidados e causam impactos negativos ao meio ambiente.
A indústria do couro envolve muitos riscos tanto para o meio ambiente quanto para as pessoas que trabalham nela. A maior ameaça ao ambiente é o despejo de lixo sólido e líquido, que contêm restos de cromo e outros componentes prejudiciais. Curtir uma tonelada de couro costuma resultar de 20 a 80 m³ de água com concentrações de cromo de 250 mg/L e concentração de sulfeto de aproximadamente 500 mg/L. Usa-se pesticidas para reduzir o crescimento de fungos durante o transporte até o curtume e 70% da pele não tratada é descartada como lixo sólido. Os pelos, a gordura, a carne, os tendões vão direto para o lixo. A água usada para lavar o couro tem resíduos – pedaços de carne, pelos, bolor, cocô e outros subprodutos animais – e não é descartada de forma apropriada.
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Couro ecológico
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Existem muitas dúvidas a respeito do que é o couro ecológico. Em alguns casos ele é confundido com o couro sintético, o que leva muitas pessoas a pensarem que o couro ecológico não é pele animal e que não envolveria o abate de animais.
Mas o couro ecológico é couro de pele animal como o couro legítimo, só que o processo de curtimento das peles é feito sem os metais pesados, que são substituídos por substâncias alternativas, em sua grande maioria, substâncias de origem vegetal. Ou seja, esse couro é considerado ecológico porque os resíduos gerados na sua produção poluem muito menos o meio ambiente.
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Tecido sintético ou "Couro" Sintético
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Quando esse "tecido" começou a ser usado para produzir roupas e acessórios foi automaticamente vinculado ao couro, mas como nós falamos no começo do texto, ele não pode ser denominado couro pois não é produzido com pele animal.
Inicialmente este "tecido" sintético, parecido com o couro, tinha um aspecto muito artificial e era pouco confortável. Eu já tive uma jaqueta com esse tipo de material e me lembro de transpirar mais do que normal durante o uso.
Porém com o passar dos anos outros tipos de matéria prima e processos produtivos modernizados passaram a ser usados para produzir esses "tecidos" com resultados muito melhores.
Atualmente existem muitos tipos de "couro" sintético e alguns deles se assemelham bem mais ao couro legítimo. Tanto em relação à aparência, quanto em relação à durabilidade e, em alguns casos, proporcionam quase o mesmo conforto.
A seguir as matérias primas de alguns "couros" sintéticos que podemos encontrar no mercado hoje.
Polietileno tereftalato (PET). Esta é uma resina do grupo do poliéster usada em vários tipos de fibras artificiais. Pode ser reciclada várias vezes e já foi considerada uma alternativa mais ecológica até do que o couro ecológico. No entanto, ainda não se sabe exatamente quais são os reais impactos da produção destes e de todos os tipos de polímeros na natureza. Mas já sabemos que eles também são poluentes. Diversos estudos e análises já mostram os efeitos prejudiciais dos microplásticos para os ambientes aquáticos de água doce ou salgada.
Látex. É possível produzir um "couro" de origem vegetal, semelhante ao couro legítimo, com o látex retirado das seringueiras. A qualidade e a semelhança com o couro legítimo é surpreendente.
Poliuretano (PU). É um produto que tem boa durabilidade e produz um "couro" que se assemelha muito ao couro natural. Além disso ele é mais resistente ao ressecamento e pode ser tingido. No entanto o descarte não regulamentado de resíduos da produção e das peças pós uso pode causar impactos ambientais negativos.
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Novas alternativas sustentáveis ao uso do couro legítimo e sintético
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Cada vez mais a tecnologia nos surpreende e nos proporciona maravilhas como os tecidos semelhantes ao couro feitos a partir de resíduos vegetais. No nosso texto sobre tecidos sustentáveis aqui no blogModacad, falamos sobre o couro de abacaxi, o couro de maçã e o couro de cacto.
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O "Couro de Vinho" tem aspecto e resistência semelhantes ao couro legítimo (Fonte: ciclovivo)
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Além dessas alternativas, também existe o couro de vinho. O produto, elaborado por Gianpiero Tessitore e Francesco Merlino, sócios fundadores da empresa italiana Vegea, é composto de fibras e óleos contidos no bagaço da uva: peles, sementes e caules. Toda essa matéria prima é resíduo da produção do vinho, ou seja, este processo produtivo faz uso de algo que seria descartado.
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Polêmicas relacionadas ao uso do couro legitimo na moda
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Existe uma grande cobrança para que as marcas parem de usar pele de animais, principalmente por ONGs e instituições de defesa dos animais, e essa cobrança se torna ainda mais intensa quando se trata das grandes grifes de moda. De acordo com essas ONGs e instituições é preciso combater o sofrimento animal causado para satisfazer o ego humano.
E parece que essa luta já está causando um impacto com resultados no universo fashion. Recentemente Chanel e Prada anunciaram que não usarão mais o couro legítimo em suas coleções.
Outro exemplo do impacto desse trabalho de combate ao sofrimento animal e às agressões ao meio ambiente foi a marcante presença de Rihanna e sua marca Fenty em diversas matérias de jornais durante o mês de novembro, não pela beleza e originalidade da coleção e sim pela rejeição do público ao uso de pele animal em suas roupas de couro legítimo.
Mas não pense que essas manifestações são coisas de tempos recentes, em 2002, membros da ong PETA invadiram o desfile Victoria's Secret Fashion Show para protestar contra Giselle Büdchen que foi a estrela de uma campanha de casacos de pele da Blackglama, uma das maiores empresas de peles dos Estados Unidos.
Em 2016 foi divulgada uma ação super chocante do PETA onde peças feitas com o couro de animais exóticos estavam em exposição. Ao olhar dentro das peças, como uma bolsa ou carteira, por exemplo, os clientes eram surpreendidos com sangue e órgãos falsos de animais.
Por outro lado, ainda que a indústria da moda não use couro legítimo em suas coleções, o combate ao sofrimento animal e às agressões ao meio ambiente tem que lidar com o abate de animais para o consumo da carne e com os processos produtivos dos produtos que substituem o couro, que geram resíduos muito prejudiciais ao meio ambiente.
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História e curiosidades sobre o Couro
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O couro provavelmente foi um dos primeiros materiais usados pelos seres humanos para proteger e aquecer o corpo. Mas o processo usado para que as peles de animais não apodrecessem foi criado lentamente, ao longo de muito tempo.
Acredita-se que as primeiras evidências do uso de couro curtido são do Egito antigo, três mil anos a.C. Nos túmulos egípicios foram encontradas sandálias de couro e vários outros produtos feitos com pele animal. O estado de conservação destas peças milênios depois, mostra que a técnica de curtir o couro já era conhecida a muito mais de quatro mil anos atrás.
O processo de curtimento do couro feito pelo povo hebreu na Idade Antiga, era feito com a casca do carvalho e é possível que tenham aprendido esta técnica durante o período em que ficaram no cativeiro no Egito.
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Pergaminhos feitos de pele de cabra (Fonte: fcafotodigital)
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Em Pérgamo, também na Idade Antiga, os pergaminhos usados em grande escala para escrever textos, estudos, mensagens, comunicados, etc, eram feitos de peles curtidas de ovelha, cabra ou bezerro.
Também na China, a fabricação de objetos com couro já era praticada muito antes da Era Cristã
Diante da falta de evidências concretas sobre a história da evolução da tecnologia dos curtumes, supõe-se que as peles de animais primeiro teriam sido modificadas intensionalmente pela ação da fumaça sobre as peles. Depois, ainda resultado de processo evolutivo baseado na observação de ocorrências espontâneas, começa o uso de graxas e óleos de animais, seguido da exposição simultânea das peles a esses materiais e à fumaça ou ao calor do fogo.
Esses processos teriam se mantido em uso e em lenta evolução, até chegar à observação de que o contato com o solo provocava alguns efeitos sobre as peles. Esta importante ocorrência teria levado à descoberta do uso de restos de vegetais e plantas para tratar as peles curtidas. Então, teria finalmente ocorrido a origem do curtimento vegetal. Um marco na conservação das peles, da produção de couro flexível e durável, que se mantém como o mais eficiente processo de curtimento do couro por milhares de anos.
Ao longo dos séculos, o processo para curtir o couro nas diversas culturas variou mais em função das plantas comuns a cada região, porque na sua essência, os tanantes vegetais continuaram sendo os principais meios do processo para curtir o couro usado em todas estas culturas.
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Curtume tradicional (Fonte: kardan_adam)
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Só um pouco antes do século XX, químicos americanos observando algumas ocorrências durante o trabalho de curtir as peles, descobriram que os sais crômicos sobre as peles deixavam o couro mais flexível do que o couro curtido pelo processo tradicional.
Com esta descoberta passaram a realizar um novo processo para curtir o couro, agora à base de óleo e sabão. A qualidade do couro curtido por este processo foi um grande avanço para a indústria de calçados, tornando a milenar técnica de curtimento de couro com as cascas de árvores muito menos usada.
Os couros curtidos com o crômio já ficam prontos para o tingimento, recurtimento e acabamento, cujo resultado final atende às aparências criadas para o estilo do produto final. Atende às demandas de beleza e variedade da moda. Atualmente, cerca de 98% dos couros produzidos no Brasil são curtidos com sais de crômio.
O couro curtido com o crômio se chama wet blue. Mas o curtimento de peles com o tanino vegetal continua a ser usado para a produção de couro comercializado atualmente. A pele curtida por este processo adquire um tom castanho claro e este couro se chama wet brown.
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